Realidade e Interpretação

Por Paulo R. Käfer*

Quando eu era criança, eu adorava olhar para as nuvens, tentando encontrar uma imagem que fizesse algum sentido: um simpático cachorro, uma fada com varinha mágica, um sábio com uma longa barbicha, um golfinho e assim por diante.

Mas de qualquer forma, nuvens são nuvens. Nossa mente criativa vê coisas que de fato não existem. Vemos imagens onde tem apenas nuvens. Da mesma forma, interpretamos o mundo com base em nossas percepções da realidade.

# Uma cobra ou uma corda?

Nós, os seres considerados humanos, temos uma tendência inata ao julgamento. Formamos impressões e avaliações sobre os outros ou emitimos opiniões sobre fatos em segundos.

Quantas vezes você chegou a conclusões precipitadas sobre um fato ou sobre uma pessoa e depois de um tempo percebeu que não era nada daquilo que você tinha pensado?

Nossa interpretação sobre a realidade pode ser bem diferente da realidade. Por exemplo, uma pessoa pode levar um susto ao entrar em um quarto com pouca iluminação, pensando que viu uma cobra, mas quando acende a luz, percebe que é uma corda enrolada.

Fico me perguntando: será que vemos a realidade como ela é? Ou só enxergamos nossas projeções? Será que nossas inferências estão corretas? Interpretamos o mundo com clareza? Nossas avaliações são fidedignas?

# Em busca da lucidez

A nossa percepção da realidade é bastante distorcida por expectativas e especulações. O desejo de que o mundo se adapte à nossa maneira de ser parece uma insanidade.

Geralmente, os nossos julgamentos são na direção de como as coisas deveriam ser de acordo com nossa visão de mundo. Mas a realidade é mais ampla do que qualquer avaliação e interpretação que possamos fazer.

Acredito que um dos pilares da sabedoria é ver as coisas como elas realmente são. Uma interpretação equivocada pode gerar sofrimento, como por exemplo, quando as coisas são levadas para o lado pessoal.

Quando as interpretações errôneas e os pré-julgamentos habituais são deixados de lado, a ilusão se dissipa e a verdadeira compreensão começa a emergir. Ver o que é sem concluir precipitadamente é acender a luz, é ter lucidez! Esse pode ser o caminho da felicidade autêntica.

# Veja o quadro todo

Aqui vai uma dica: tome consciência de como você faz avaliações e de como você interpreta a realidade. Quando estamos conscientes do modo como julgamos, podemos mudar, caso detectemos padrões negativos de análise. Em geral, são nossas avaliações sobre os acontecimentos que provocam aflições e nem tanto os fatos ou o comportamento alheio.

Nesse sentido, é necessário cautela com pré-julgamentos e convicções limitantes que estreitam a realidade. Considerar apenas elementos parciais pode ser inadequado. A grande sacada é procurar ver o quadro todo e não só uma parte.

Precisamos ver a unidade na diversidade, o todo na parte, a parte no todo, enxergar a floresta sem se esquecer da árvore e vice-versa.

Quem possui visão sistêmica, analisa as questões por vários ângulos, antes de tomar qualquer decisão e não se deixa iludir pelas aparências dos fenômenos, procurando sempre a essência dos mesmos. Não faz análises superficiais nem se apressa em realizar julgamentos baseados em meras opiniões.

Ao contrário, procura penetrar na realidade com sagacidade, o que lhe permite ver a essência por trás da aparência e enxergar a verdadeira natureza da realidade além da forma.

Se pensarmos nas relações humanas, por exemplo, acolher a visão de mundo do outro, ou seja, compreender e respeitar o outro em sua realidade sem lançar mão de julgamentos, trará paz nas relações ao passo que impor ideias sem considerar a opinião do outro, pode gerar conflitos desnecessários.

Nesse contexto, imposição é considerar apenas uma parte, mas acolher é ver o quadro todo. Da mesma forma, quando julgamos, vemos uma parte da realidade. Quando acolhemos, compreendemos a realidade. Nas palavras de Madre Tereza de Calcutá: “quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las”.

E como o mundo está precisando de mais amor… E paradoxalmente, se nutrirmos mais amor em nossos corações, poderemos “mudar a nossa realidade”.

Quando ampliamos nossa perspectiva e adquirimos novos referenciais, interagimos de modo efetivo com o mundo externo e tomamos decisões melhores e mais conscientes.

# Suspendendo julgamentos

Há um conto zen muito breve, mas profundo que nos faz pensar…

Dois homens estavam discutindo sobre uma flâmula que tremulava ao vento:

– É o vento que realmente está se movendo! – declarou o primeiro.

– Não, obviamente é a flâmula que se move! – contestou o segundo.

Um mestre, que por acaso passava perto, ouviu a discussão e os interrompeu dizendo:

– Nem a flâmula nem o vento estão se movendo – disse. É a mente que se move.

Para ver a realidade como ela é, precisamos cultivar um estado mental tranquilo. Se estivermos com a mente cheia, impacientes e agitados como uma bandeira ao vento, somos presas fáceis das ilusões. Nesse estado inquieto, a realidade aparece distorcida para nós.

Ao contrário, quando estamos calmos, é como se víssemos a realidade em “High Definition”. Por isso, as práticas meditativas e contemplativas são tão benéficas: elas nos ajudam, entre outras coisas, a ver a essência por trás das aparências e o verdadeiro por trás do ilusório.

Quando foi a última vez que você parou suas atividades por alguns instantes para acalmar a mente e apaziguar o coração?

Uma vida mais interessante começa a se desenhar quando reduzimos os julgamentos prematuros. A felicidade autêntica já habita dentro da gente. Mas pode ser abafada pelo fluxo incessante de pensamentos, opiniões e avaliações que surgem em nossa mente.

Quando suspendemos o modo habitual de julgar eventos ou pessoas, mesmo que temporariamente, nossa percepção da realidade fica mais nítida e a serenidade é apenas uma decorrência dessa prática.

Espero ter contribuído de alguma forma com essas reflexões. Agradeço sinceramente a sua visita aqui no blog, grande abraço, paz na mente e até o próximo texto.


Paulo R. Käfer

Facilitador de Treinamentos Empresariais com mais de 10 anos de experiência na área. É Instrutor da Formação de Multiplicadores – Facilitador Coach©  com várias turmas realizadas e diretor da MKaPlus, empresa especializada em ajudar instrutores e facilitadores a terem alta performance e realizarem treinamentos fantásticos.

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3 thoughts on “Realidade e Interpretação

  1. Excelente reflexão sobre o olhar e enxergar. Aparência X realidade. Quase sempre as pessoas julgam pela aparência sem conhecer o todo. Vislumbrar horizontes é verter-se à realidade, chegando a um cenário completo. Isto é verdadeiramente a arte de contemplar. parabéns por esta reflexão.

  2. O ¨não julgar¨pode ser um caminho direto para o encontro da serenidade. Texto excelente que gera reflexões fantástcas . Parabéns!

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